Covers environment, transportation, urban and regional planning, economic and social issues with a focus on Finland and Portugal.

Tuesday, February 20, 2007

Transferência de competências da administração central para a local

Ao longo das últimas décadas, os estados têm vindo a perder o largo controlo económico e financeiro que detinham nos seus territórios. As privatizações, a abertura de mercados à concorrência externa e a revolução tecnológica, vieram introduzir novos e complexos desafios.
A mudança da estrutura do trabalho e a persistência dum desemprego estrutural, os consequentes problemas sociais, de saúde pública e todos aqueles causados por alterações demográficas (envelhecimento populacional, aposentação e baixa taxa de natalidade nos países desenvolvidos) provocaram alterações na procura de serviços e no seu financiamento , geraram pressões para aumento de impostos e produziram uma migração populacional para as grandes áreas metropolitanas.

Continue a lerHoje, estes desafios não podem ser ultrapassados apenas por um nível de poder estatal isolado. São necessários vários níveis de poder democrático, que abranjam o território e cooperem efectivamente entre si e com o os outros sectores externos ao sistema público.Com o objectivo de manter a coesão social, surge necessidade de implementar a transferência de competências para as autarquias locais, devendo esta estar enquadrada numa estratégia de mobilização das populações, que dê efectiva resposta aos fenómenos da globalização.

Presentemente, em Portugal, está a ser debatida a transferência de competências da administração central para a local nas áreas da educação, saúde, acção social, ambiente e ordenamento do território, pretendendo, o governo, que o projecto final de transferência de competências venha a estar concluído no primeiro semestre de 2007, para que seja possível a consagração de mais verbas no Orçamento de Estado para 2008. As negociações entre o governo e ANMP têm por base a as competências previstas no artigo 22º da Lei 159/99 e no artigo 24º da Lei das Finanças Locais, o qual especifica, no ponto 1, o Fundo Social Municipal:

“O FSM constitui uma transferência financeira do Orçamento do Estado consignada ao financiamento de despesas determinadas, relativas a atribuições e competências dos municípios associadas a funções sociais, nomeadamente na educação, na saúde ou na acção social.”

Factor tradição

A distribuição de competências entre estado e governos locais é muito variável, dependendo de diversos factores (históricos, culturais, geográficos,etc.). Dentro da UE, os factores históricos tiveram bastante influência na organização das administrações públicas.

Nos países do Sul da Europa e Mediterrâneo existe uma marcada tradição de administrações centralizadas, que fornecem directamente os serviços ou supervisionam e prestam assistência aos poderes locais, na provisão desses serviços.

Nos países do Norte da Europa, o Estado nunca manteve muita capacidade executiva fora das capitais, tendo transferido para os governos locais, a maioria da responsabilidade pela prestação de serviços às populações. Como resultado, os governos centrais desses países tomaram e continuam a tomar medidas radicais de reorganização das estruturas locais ( p.e. amalgamação de municípios), de forma a poderem adquirir uma dimensão suficiente para gerir eficientemente os serviços.

No Sul da Europa, muitos pequenos municípios sobreviveram na dependência de agências estatais. Contudo, nas últimas décadas, particularmente em França, registaram-se bastantes mudanças e os contrastes têm tendência a atenuar-se.

Na UE, o processo de organização territorial e devolução desenvolveu-se rapidamente no início dos anos 90, com a atribuição de competências no âmbito das infraestruturas básicas. No entanto, ainda permanecem atrasos nas reformas dos níveis superiores da administração central, afectando a velocidade de transferência de competências na área da educação, da saúde e da acção social.

Portanto, o factor tradição tem sido determinante, mas as mudanças evolutivas do sistema só poderão operar -se com base em critérios racionais, os quais se descrevem genericamente de seguida.

Vantagens da devolução de responsabilidades ao Poder Local:

- Vantagem em adaptar os serviços à procura local e às condições locais.
- Oportunidades para inovação, com riscos localizados, mas com potenciais benefícios nacionais.
- Aumento de responsabilidade dos funcionários locais, com um melhor atendimento às populações locais.
- Potencial para coordenação de serviços e investimentos que lidam com problemáticas comuns .
- Eficiência governativa local incrementada pela partilha de serviços comuns.
- Capacidade de aproveitar recursos locais, tais como impostos, “know-how” e responsabilidade social.

Desvantagens da devolução de responsabilidades ao Poder Local:

- Disparidades no nível de serviços prestados ao longo do território, sendo desejável uniformidade e igualdade de oportunidades, particularmente no sector da educação.
- Excessiva interferência política em processos em que é necessária imparcialidade e visão de âmbito nacional.
- Excessivos interesses corporativos, para os quais os políticos locais poderão não ter o “peso político” necessário.
- Jurisdições das autarquias locais poderão ter uma dimensão demasiada pequena para viabilizar serviços ou para conseguir atrair profissionais especializados.

Formas de superar as desvantagens da devolução:

- Cooperação inter-municipal (no sentido de superar as dificuldades das entidades locais de menor dimensão).
- Atribuição de funções a níveis de poder mais elevados (no sentido de superar as dificuldades das entidades locais de menor dimensão).
- Contratação externa de serviços (no sentido de superar as dificuldades das entidades locais de menor dimensão).
No entanto, esta prática pode tornar-se inadequada no âmbito de serviços de carácter social, para os quais o sector privado pode não estar especialmente vocacionado.
- Equalização financeira, no sentido de superar as desigualdades regionais.
- Devolução deverá ser acompanhada pelo desenvolvimento de sistemas de audição e inspecção eficazes.

Devolução não significa abdicação de responsabilidades - implica uma intensa cooperação entre todos os níveis de governo democrático.

Referências:
Davey, Kenneth, Division of reponsibility between levels of power, 2003

allvoices

Thursday, February 8, 2007

Portugal é um dos países mais centralizados da UE

Portugal é um dos países mais centralizados da União Europeia, tendo 30 anos de uma relativamente jovem democracia parlamentar[55] e de um poder local democrático[56]. A Finlândia tem uma democracia parlamentar centenária e é um dos mais descentralizados países da União Europeia. Factores históricos e culturais terão certamente contribuído para este desfasamento, claramente reflectido na competitividade, “transparência”[57] e “desenvolvimento humano”[58] dos dois países.

Continue a lerAssim, assume um papel decisivo a questão da “descentralização/regionalização”. A Finlândia possuí uma longa tradição de autonomia municipal e de descentralização administrativa e política. No entanto, a regionalização finlandesa está a ser desenvolvida duma forma progressiva e experimental - os seus orgãos deliberativos (assembleias regionais) são compostos por representantes eleitos pelos membros dos municípios por um período de quatro anos, o tempo entre eleições locais, sendo, portanto, não directamente eleitos pela população(em Portugal a CRP define um misto de sufrágio directo e indirecto para as eleições regionais).

Em Portugal, torna-se cada vez mais necessário acelerar o processo de descentralização, criando desde já infra-estruturas administrativas, antes do futuro referendo obrigatório. É fundamental diminuir as desigualdades e desequilíbrios económico-sociais territoriais, evitando “neo-centralismos”, mas não permitindo que estes constituam um bloqueio ao processo.

A democracia não se reduz a uma eleição legislativa quadrianual, nem ao multipartidarismo. É a combinação de vários níveis de organização democrática de dimensão espacial territorial com várias formas de democracia que potenciem diariamente a participação democrática das populações. É esta matriz dinâmica de forças democráticas que terá de ser melhorada, havendo ainda um um longo caminho a percorrer - é necessário que as “pirâmides do poder” reduzam a sua “altura” e se redistribuam equilibradamente ao longo do território.

[11. Portugal é um dos países mais centralizados da UE - "Finlândia: Municípios e Descentralização"]

Luís Alves
____________________________________________
[55] A 25 de Abril de 1975 realizou-se a eleição para a Assembleia Constituinte,a primeira eleição por sufrágio verdadeiramente universal realizada em Portugal, com uma afluência histórica de 91% dos cidadãos recenseados.
[56] 30 Anos de Poder Local Democrático, Comemorações - Junho de 2006 a Junho de 2007, www.anmp.pt/anmp/div2006/30a
[57] Global Corruption Report 2006, www.transparency.org/publications/gcr
[58] Human Development Report 2006, hdr.undp.org/hdr2006/pdfs/report

allvoices